terça-feira, 29 de maio de 2012

  Como viver duas vidas?
  Estar em dois lugares, dividida,
  amando e odiando ao mesmo tempo
  Tem como não romper com a antiga intimidade e deixar que a nova floresça, dessa maneira vertiginosa com que ela brota?
  Vale a pena fazer isso?
  Por que mesmo que eu to indo embora?
  Mas quer saber, o melhor é esquecer!
  A saudade queima e consome
  Já não importa em qual lado eu vá pender
   a falta do outro já destrói
  Sair, fugir, mudar, sonhar, desistir, afogar
  não importa o nome que dê
  romper costurou os lados
  em você
  Peças que não encaixam
  outro idioma
  e ao meio
  você
  Os lados esticam esgarçados
  eu desespero e tento não desfiar
  desvio um pouco o caminho 
  reencontro o que antes era o rumo
  E pra onde vai me levar
  rumomes sossegam e falam que eu vá
  insone eu agarro 
  e abandonada me sinto abandonar
 

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Riquezas e road movies


"Tem a ver com experimentar, acima de tudo. Tem a ver com o que pode ser aprendido com o outro, com aquele que é diferente."

Acabo de ler o livro "Na estrada - o cinema de Walter Salles. Quando ele filmou Diários de Motocicleta, seguiu os passos do Che e do Alberto, visitou pessoas que os conheceram e estiveram naqueles momentos históricos com eles. Fez o trajeto pela América Latina que eles fizeram na Poderosa. Olhou pelo ponto de vista de seus personagens, experimentou. Morou seis meses aqui em Buenos Aires durante suas pesquisas.
Agora está para lançar "On the road" o livro de Jack Kerouac. E no seu processo de pesquisa também seguiu os passos de Kerouac, aproveitando para gravar o documentário "Searching for on the road". Em uma conversa com Wim Wenders, ele diz que o único risco é o documentário ficar melhor que o filme.
Wender e Salles defendem os road movies. Acreditam que a existência está mais na jornada do que no destino final.
O nomadismo está presente em nosso sangue, não há dúvidas. As almas inquietas e de espírito livre estão soltas por aí, anonimamente. Estão por todos os cantos, em nossas casas.
Já assisti muitas pessoas desistindo de fazer algo que realmente gostam para fazer algo que lhes dê um bom monte de dinheiro, e esse ato é tanto consciente quanto inconsciente. Fazem esse disserviço para o espírito sem pensar que essa necessidade de consumo não é real, e esvaziam-se.
Defendo com unhas e dentes que a verdadeira riqueza está na experiência. Sou da turma do "viver tudo de todas as maneiras possíveis". Nada me enriquece mais do que desvendar o desconhecido.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Malas prontas

  Fazer as malas. Foi impulsivo, de susto, ainda embalada pela noite passada, com sono de entontecer a mente. 
  O que eu queria colocar naquelas malas, nem de longe caberia. Então fui resignada, dobrando as roupas, junto com os sentimentos, esmagando-as naquele espaço pequeno que tanta coisa deveria levar. Tudo o que eu precisava na vida. Mas tantas coisas precisava levar e não podia.
  Fazer as malas. Um misto de necessidade preventiva, e revolta. Os objetos tornam-se obsoletos, tanto quanto essenciais. O que  sobrou do meu mundo de vinte anos de re-conhecimento? Vinte anos no mesmo lugar, tantas raízes... quando comecei a amadurecer, quando os frutos começaram quem sabe a despontar... enfim, todas essas coisas de fins e recomeços... fica pra outra hora.
  Fiz as malas disse tchau e parti.
  Foi simplesmente isso. Foi só adeus. Um obrigada pela atenção, mando notícias. Ligo quando chegar.
  Foi só isso e nada mais. Minha avó ficou no quarto porque as costas doíam, e minha mãe não saiu na rua pra dar tchau pelo sol. Os amigos na rodô, foi pelas inúmeras malas, não poderia carregá-las sozinhas. O último abraço, o último abraço em que reconheceria aquela intimidade... talvez a ficha tenha começado a cair nesse momento. Talvez não.
  




O que levar nas malas:

  • basicamente o que vai esquecer em cima da cama.

terça-feira, 8 de maio de 2012

As noites são escuras e os dias São Carlos;




Desde o primeiro suspiro trêmulo,
Os primeiros pios dos pássaros [outros]
Os primeiros raios da dúvida
Os primeiros esquecimentos dos quilômetros detrás.

Era caso de alçar voo. Liberdade pra quem mais queria. E a sensação de que este era o lugar certo. Na solidão do campo e na calmaria do rio o pulso grita. Ecoa, assustando a revoada de colibris.

as almas de ligação direta
caminhando entre o orvalho da grama
o tempo no zero.

pessoas de crânio exposto
buscando por mais e mais respostas
com ideias em espirais engolindo espirais
a Busca da Iluminação infinita

as árvores são fortes. as raízes vão fundo, no âmago da terra, ligando todas num mesmo lugar que é de pureza branca. os galhos atingem já as pontas do futuro, apesar do fungo que apodrecem pequenas partes do seu tronco, da seiva que escorre grossa,

- Não brilha!

venenosa. das bocas de maxilar corroído, cuspindo pragas.

é a plenitude em reflexo da lua
de Escorpião.
de Júpiter. a Lua roçando os pés na água.

é ser maluco. bicho do mato, bixo. é ser da Fauna.
é ser a Flora.
é dançar sapateado no ataque de saúvas que devastaram a plantação de Policarpo Quaresma.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Marginalildade


Porque é onde realmente encontro vida. Na margem.
No pensar dia a dia passo a passo qual será a próxima etapa, nada de beiras, mas de linha reta, de seguir em frente.
O da teoria vira prática: deixar de ser "confortably numb", deixar de ficar ficar sentado em nossas próprias bundas e fazer jus a nossas móleculas sempre em movimento. Movimentar-se.

A dualidade da corda bamba é inevitável: de um lado a vontade de assistir as consequências dos esforços, e do outro a vontade de explodir todos esses esforços e voltar ao Carpe Diem inicial, ao hedonismo de sempre, sempre satisfatório.

Estar na margem, andar nessa corda bamba e assumir seus riscos, abalar toda a proteção construída desde o nascer atrás de algo comum, banal, que todo mundo tem um. Sonho.

Uma reconstrução diária de cada tijolinho. E o mais difícil: largar o ninho, desfazer-se do que já passou. Focar no agora e manter as lembranças no passado, difícil pra caramba.

Repito, quase todas as manhãs, o mantra hermano marginal: aponta pra fé e rema.

Primeiras Impressões




         Cheguei em São Carlos. Ok. Aquela rodoviária, exatamente igual a todas as outras rodoviárias. Poderia estar tanto em São Carlos, como em Itajubá, não perceberia a diferença. Um nó na garganta, e a preocupação de que o moço que me encontraria lá, não estivesse lá. Ele estava. No caminho até sua casa passei pelo centro da cidade a noite. Achei muito rápido, muitos carros, parecia uma avenida com o centro nas beiradas. Entrando no bairro dele, a paisagem mudou, ruas escuras, com aquelas casas de quintais imensos, bancos de madeira na frente das casas, muitas árvores. Me senti muito mais confortável naquele momento.
         Cheguei no meu quarto, amontoei as malas em um canto, sentei na cama, e vi que tremia. A percepção das mudanças acontecem na medida que mudam, e não da consciência que achamos que tomamos delas. Medo era pouco pro que eu sentia, desamparo explicaria melhor.
         No dia seguinte o trote, a apresentação. Aqueles treze cigarros que fumei compulsivamente na frente do auditório da apresentação, com aqueles que seriam meus colegas de sala, alguns prováveis amigos, alguns que eu não gostaria, outros que eu nem saberia o nome, pelos próximos quatro, quem sabe cinco anos. Foi engraçado as coisas que passaram pela minha cabeça. Todo mundo se olhando, curioso, apavorado, tímido, descolado. Depois o trote... ele vem e avassala com todos os seus receios, não porque te faz sentir segura, mas porque não te dá espaço para ter receio. Fui pintada, simulei que morria tomando tiros de uma metralhadora, outro carregou a pedra filosofal quilômetros, além do pedágio, no sol que eu não sabia, mas só São Carlos tem. O almoço barato e delicioso, aquelas figuras que depois eu nem reconheceria sem a tinta. Voltando desse pedágio me perdi umas três horas pelo bairro, encontrando uma sensação horrível de que não sabia cuidar de mim mesma.
         Assim foi minha primeira semana em São Carlos, permeada por dias áridos e de poucas expectativas, com noites apaixonantes, cheias de descobertas. Dias extensos, que nunca mais se acabavam. Que a cada momento fixavam em mim, uma nova impressão, a noção sem contornos do seria então meu mundo. Aprendi nessa primeira semana a amar e a odiar esse lugar. Amar suas esquinas, e desviar enojada de todas essas burocracias, essas mesquinhezes que rodeiam as instituições. Aqui a necessidade se prova com inúmeros documentos, ou com uma conversa simples com aqueles que já passaram pelo mesmo que você. E o que não me faltou foi esse auxílio, cada dia que passei antes de conseguir minha vaga na moradia, foi em uma casa diferente, em cada casa, senti o acolhimento, a ajuda, daqueles que também precisaram e assim como eu, a encontraram.
         Essas foram as primeiras imagens, que a ferro e fogo, São Carlos desenhou em mim. Esses são os primeiros desenhos que posso rascunhar do que espero um dia entender.